Um santo remédio
Tentava encontrar uma posição mais cômoda no velho sofá da
sala para assistir ao noticiário da máquina retangular quando me deparei com a
agradável notícia de que haviam achado o remédio adequado para tratar todos os
males econômicos pelos quais atualmente passa a república dos paletós
intocáveis. Espantado com a solução mágica que parece ter sido fruto de um
conluio entre o tribunal de corvos e os políticos que fazem oposição ao governo
do Partido do encaixador de peças pus sebo às canelas a fim de ter explicações
com algum mandachuva da minha terra, a província dos caranguejos. Primeiro
dirigi-me ao local onde ficam os paletós que fazem as leis da província dos
caranguejos, a fim de que algum cacique fizesse uma honesta tradução da
atabalhoada vereda econômica dos paletós intocáveis e me fizesse entender
porque a nossa república empenha-se tanto no combate ao “dragão” que outrora
arruinou a vida dos despossuídos, queria entender a origem da tão falada
inflação e porque usamos sempre o mesmo remédio para trata-la. No entanto, bateram
sê-me várias portas e nada me foi explicado. Por pouco não desisti de
compreender as obscuras razões que levam os nossos mandachuvas a afugentar o
indesejável dragão com o corroído e decrépito teorema do aumento dos juros e
por que em épocas de crise os donos do tesouro esfolam a classe operária com impostos,
tarifas e taxas estratosféricas, além de lança-los à rua, pois os lucros devem
ser mantidos a todo custo, ainda que se espalhe a fome e a miséria pelo mundo
afora. Após uma pesquisa sobre a titânica crise dos paletós intocáveis, percebi
que a “ solução final” para os graves problemas financeiros da maior economia
dos trópicos vinha da putrefata cartilha neoliberal e ortodoxa e por mais que
se proponham outros projetos ou ideias para solucionar a crise econômica dos paletós
intocáveis, o tribunal de corvos acredita que o infalível mantra neoliberal
deve ser a lei quando o assunto é economia. Na defesa cega e intransigente dos alicerces
poucos sólidos da economia ortodoxa repetiu-se o velho esquema da “socialização
dos prejuízos”, onde aqueles que permanecem alijados do poder econômico devem se
tornar a solução do problema tornando-se desempregados, e se empregados
precisam aprender a fazer malabarismo e toda sorte de mágica com seus minguados
salários para que se lhes não falte o que vestir e o que comer, pois até o uso
da energia elétrica tornou-se um luxo nesse estranho desenho de democracia cravado
nos trópicos. Sabemos que o atual cacique das finanças é um homem metido com os
bancos privados e é mesmo tido como um grande estudioso da economia pelo
partido da moeda salvadora e pelos corvos midiáticos, que propagaram aos quatro
ventos o irreprochável “ ajuste fiscal” a que foi sentenciado o povo da
república dos paletós intocáveis. Assim como o inventor da grande moeda, que num
grandiloquente arrebato de intelecto salvou a acuada nação tupiniquim dos
assopros do dragão, o homem do “ajuste”, que numa baforada de lucidez e
inquestionável racionalidade cortou os recursos que aliviavam a dor e o
sofrimento dos descamisados, fazendo-nos crer que é mesmo melhor que continuem
sem camisas, pois comprando camisas, carros, motos e viajando de avião os despossuídos
podem causar inflação. Como vês, caro leitor, a nossa república parece
irreversivelmente comprometida com o bem-estar de seu povo e seus mandachuvas tomam
todas as decisões sobraçando um Tratado de Cícero ou Sêneca para estarem
seguros de que conduzem com sabedoria e erudição o desditoso tumbeiro de
corrupção que açoita e faz sangrar o nosso povo.
Comentários
Postar um comentário