Num passe de mágica


Os minguados leitores que me acompanham nesta infrutífera batalha contra as engrenagens que movimentam as tortuosas virtudes democráticas da República dos Paletós Intocáveis, sabem que na condição de nativo dessa virtuosa sociedade tupiniquim, nunca percebi nenhuma utilidade no circo midiático que despeja diariamente suas novelas, seus filmes americanos reprisados e esses hit singles que tornam o nosso povo alienado de tudo que se passa nesse dantesco picadeiro em que abundam as estripulias e as maracutaias desses nossos mandachuvas. Mas não pretendo falar sobre o circo onde ficam os dignos legisladores de nossa ilustre nação, quero falar-vos mais uma vez sobre os tais folhetins da TV do Plim Plim também conhecida como Globolândia. Além do carcomido e decrépito esquema de estórias, no qual um businessman é sempre o sol de um desajustado sistema solar em torno do qual giram vários astros celestes menos talentosos na elevada arte da acumulação de riquezas. Há outro aspecto sobre a teledramaturgia tupiniquim que merece a atenção do povo dessa esquálida figura republicana: os personagens que num lance de grande sorte tornam-se ricos do dia para noite! Como todos vós sabeis todos os folhetins fabricados na Globolândia têm personagens agraciados com as benesses do tesouro e àqueles que foram marcados com o inglório ferrete da pobreza e do ostracismo social. Só que na terra paradisíaca onde mana leite e mel, os personagens despossuídos do tesouro são apresentados no início do enredo como pobres-diabos e de repente ei-los ricos e os farrapos que envergavam nos primeiros capítulos do folhetim são trocados por ternos ou pomposos vestidos. Isso deve mesmo causar muita confusão para os telespectadores que não conseguem acompanhar todos os capítulos destes nossos romances da máquina retangular. Pois imaginem que decidi assistir à novela das nove e percebo que uma das personagens é uma vendedora ambulante e depois de dois desventurosos dias sem saber o que se passava nas terras da Globolândia, vejo a antiga ambulante vestida como uma Lady tupiniquim, cheia dos maneirismos e dos calculados trejeitos da arte da etiqueta , tratando aqueles que a consideravam uma pária como uma polidez impecável e aprendendo gradativamente a ciência da civilização , que não  deve incluir os seus antigos pregões de vendedora ambulante , nem sua bárbara descompostura de favelada. Os nativos pobres da república dos paletós intocáveis devem saber que os louros da pequena burguesia ou mesmo da fortuna não são conseguidos em lances de sorte, pelo menos fora dessas macilentas fábulas sociais da TV do Plim Plim. Fora dessa Disneylândia a meio caminho ambulantes não encontram sem algum esforço e homérica insistência o trampolim que possa lhes conduzir a vida pequeno-burguesa ou até a imensurável fortuna dos jogadores de futebol ou lutadores de MMA, talvez hoje os alpinistas sociais que causem maior sensação no povaréu dos paletós intocáveis. Como vês, caro leitor, não me canso de falar sobre essa teledramaturgia, que insiste em distorcer a real situação de nosso povo, além de alimentar sonhos inalcançáveis de consumo para as massas empobrecidas, que lançam olhares suculentos aos carros importados de seus xodós dos folhetins globais, sonham com iguais corpos esculpidos com toda sorte de drogas e dietas neuróticas e com a profissão mais bem paga de nosso país: a celebridade! Como cidadão deste esboço de república sinto-me cada vez mais assustado com as esdrúxulas virtudes da tevê destes bravos descendentes do povo tupi, onde o império da moeda reina absoluto e a conquista do famigerado lugar ao sol na selva do capitalismo é sem sombra de dúvida a cartilha que rege as nossas vidas e parece ser hoje o nosso Pai-nosso.

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