O homem de toga e a espada,
Ossadas dispersas naquela funesta seara de ódio e
irracionalidade ...
Um corpo ereto, levantado com grandiosos espasmos de energia,
tentava firmar-se ...
Cambaleou três ou quatro vezes ...
Percebeu que trazia um objeto à mão, banhado em sangue...
Num movimento lento, mas furioso, ergueu a mão que trazia a
lâmina fria e a pôs em frente ao seu rosto e perguntou-lhe:
- O que fazes na minha mão, funesta criação dos seres de
barro? Nunca fui talhado para as guerras, hecatombes e destruição e por que te trago
com o sangue de tantos homens à minha mão?
Ao que a fria lâmina replicou com ar zombeteiro:
- Tu sempre me carregaste homem de barro! Como achas que
conquistou teu uniforme que te distingue dos párias, que lhe deu os tão
sonhados louros da sociedade.... Não te agrada ser chamado de Meritíssimo nos
tribunais ?! Eu te dei a coroa pútrida do distintivo social e agora tu me rejeitas,
oh quanta ingratidão de Sua Majestade...
O homem interrompeu o discurso sarcástico do objeto de metal
irrompeu numa resposta furiosa:
- Ora, o que tu
disseste é um absurdo! Nunca matei ninguém exercendo o meu nobre ofício,
dediquei-me ininterruptamente ao estudo das leis da civilização ocidental e ao
nosso dever de respeita-las e conduzi-las ao progresso!!! Tu me insultas vil
metal !!
Num tom calmo, beirando a generosidade a espada pergunta ao
ser de argila:
- Olhaste o mendigo à
porta da tua casa? Já refletiu sobre quantas crianças africanas morrem todos os
dias por falta do que na sua mansão há em fartura? E esta toga, ah!Esta toga
com a qual julga os que se desviam dos normas da civilização? Tu não só me
carregas criatura do barro, como me suja de sangue com uma brutalidade
civilizada e maquiada de normas que tu e os teus semelhantes entendem ser as
mais justas! Sempre me desagradaram essas instituições carcomidas e decrépitas
que me lavam de sangue, destruição e chacinas! Tantos anos dedicados ao estudo
de tratados filosóficos e leis e nada compreendestes sobre a espada que
carregas bem à tua cintura? Não posso avançar esta interessante discussão, pois
tenho deveres a cumprir, caro homem de toga. Crianças inocentes precisam ser mortas,
há vilarejos à minha espera, teus semelhantes precisam exercitar sua vocação civilizatória,
Adeus!
O corpo ereto recoloca a espada a cintura, observa
atentamente o amontoado de ossos ao redor e caminha ...
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